O funeral

Ela saiu de casa toda vestida de preto. Não se importou em se maquiar, apenas se limitou ao batom cotidiano. Ele não merecia qualquer esforço da parte dela em melhorar o visual. A situação não comportava isso, seria uma simples conversa com o bufão. A última tentativa de desconstruir a imagem desta criatura que tanto fez mal a Heloisa. De fato, ele havia caprichado no perfume. Habit Rouge. Um cheiro que fede a livro velho, amadeirado, que ela até "gostava" enquanto esteve com ele em um relacionamento. Na verdade, ela suportava, não chegava a apreciar. Mas uma vez o elogio feito, o arlequim francês passou a codificar o perfume como se fosse o máximo e a agradasse. E ela percebeu que ele se esmerou demais em colocar o tal perfume para encontrá-la. Trajava uma camisa cafona estampada com padronagem dos anos 70 e uma calça jeans rasgada. Sim, tênis all star. Quando ele a viu toda de preto, estranhou. Perguntou se ela vinha do trabalho. Ela elegante e com ar de executiva, ele largado igual a um traste. O preto para Heloisa simbolizava o enterro da criatura. A cada palavra por ele pronunciada, a distância entre os dois aumentava. Em um certo momento o piegas chegou a pegar a mão dela. Durou uns 5 segundos, pois ela fez questão de puxar a mão para se esquivar do contato. E não se contaminar com a energia pesada dele. O farsante pediu até desculpas pelas sandices pronunciadas em outros tempos. Não tem o que desculpar, pois as pessoas devem ter consciência dos seus atos. O pior tipo de pessoa é aquela manipuladora. E ele sempre foi assim. Terminou também assim, ao querer reverter a própria imagem como a de um bom moço. No fundo ele é um ser inseguro, instável emocionalmente, oportunista, demagogo, um cara que se acha o máximo, mas nem crer em Deus ele crê. Não vem ao caso ficar enumerando as coisas ruins de tal criatura, pois é claro que existem também as coisas boas. Caso contrário, Heloisa não o teria amado tanto. Amou ou se iludiu? Agora não importa mais. Nem interessa saber. Ela caminhava de volta para a casa e pensava: desta vez, o livro preto e grosso, com odor de habit rouge foi fechado, encerrado. Ocupará uma das prateleiras da estante da vida de Heloisa Tebazile. E ali permanecerá junto com a poeira dos tempos.

Comentários

click disse…
Querida parabens pelo belo texto e pela finalização de algo que a incomodava, agora livre de corpo e alma, voe, voe o mais alto que puder e veja que que o cmainho esta livre pra ser feliz, bj grande e boa sorte